segunda-feira, 7 de março de 2011

O Discurso Do Rei

Assisti ao filme este fim-de-semana, deitada no sofá, os olhos a querer fechar, porque o tempo pedia sesta e também porque o ritmo da película não faz propriamente disparar a adrenalina, mas alerta até ao fim, mesmo nas partes em que os diálogos dessíncronos se sobrepunham às legendas adaptadas e o cérebro ameaçava fazer curto-circuito (tenho uma dependência grave da língua de origem e de legenda em português à percentagem de setenta e trinta por cento, respectivamente - a minha grande relutância em emigrar deve-se a essa mania tão resto-mundana de dobrar tudo o que não é língua materna).
Dizia então que finalmente vi o filme. E foi um finalmente!, o que é bom. Tenho-me sentido defraudada por muitos dos filmes que vão ficando pendentes mas nunca esquecidos e que um dia se me apresentam em toda a sua esplendorosa desilusão (como foi o caso recente d'A Dúvida), mas desta vez a coisa correspondeu ao esperado. Podia falar na atenção aos pormenores, na força dos personagens, no bom resultado da forma escolhida para se adaptar este enquadramento histórico específico, mas disso fala quem percebe, quando o que o distingue tem sobretudo a ver com o que ele me diz a mim e não à academia.
Eu existi dentro daquele Rei e das suas limitações. Eu vivi a privação da impotência, a frustração da batalha infrutífera com o seu eu, a agressividade que resulta de não se saber lidar com a diferença sendo diferente. A minha luta, a minha impotência, a minha frustração e a minha agressividade souberam reconhecer-se e resignaram-se, por duas horas, perante o consolo da gaguez de George VI. E senti-me confortada com o ultrapassar de um obstáculo, com o suspiro de alívio que a queda de um muro pode trazer, com a satisfação da quebra das barreiras invisíveis, uma de cada vez.
Da amálgama que constitui a mistura de todas as nossas qualificações e limitações, sobressai a prevalência que todos partilhamos pelo medo do fracasso.

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