quarta-feira, 22 de setembro de 2010

o suposto tédio

Gosto de ler os outros, sobre o que escrevem, aquilo que pensam, que defendem, que atacam, que os escandaliza ou preocupa, que os realiza. Ler o que outros escrevem é como observar um cenário que, de repente, pára para nós. Por isso gosto de ler toda a gente: os que me irritam, os que se revelam muito sensíveis, os inteligentes, os politicamente correctos, os espalhafatosos, os reservados, os interessantes, os obscuros, os indecifráveis e os transparentes. Critíco muito para dentro. Da mesma forma que faço quando observo as pessoas. A diferença, é que no terminal do aeroporto não podemos congelar o tal cenário, para fruí-lo convenientemente: o homem que observa por cima dos óculos todas as mulheres que vão passando, o atrapalhado que se veste e se move de forma desajeitada, a brasileira que exibe luxuriosamente as curvas bronzeadas, entre o brega e o chique, os miúdos chatos que guincham alto e que não queremos ouvir, a hospedeira bem disposta, o segurança de ar sisudo, os bons ares de quem vai partir e os ares extenuados de quem chega de longe, a correria, a impaciência, a excitação, a monotonia.
Há pessoas que me cansam mais depressa. Ou pela sua insolência ou pela sua ignorância, ou porque são aborrecidas ou pouco interessantes. Por isso deixo de lê-las, não perco tempo a observá-las. Outras fascinam-me. Ora porque me impressionam na sua grandeza, ora por serem aberrações irresistíveis.
Ando farta da informação empacotada, que veícula igual em todo o lado, que nos é imposta e vem pronta-a-consumir, sem questionar. Não me apetece ler líderes de opinião e supostas figuras da praça pública, da política, do desporto, dos sindicatos, das instituições ambientais cujos porta-voz degradam o ambiente tanto como eu. Apetece-me gente normal, que fale do quotidiano, que escreva sobre nada, sobre pequenos nadas. Apetece-me ir para o terminal do aeroporto, congelar cenários e olhar demoradamente para as pessoas.

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